XV CONJUFRA SANTA MARIA-RS

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

O Espelho de Clara de Assis


Se existe um objeto obrigatório que acompanha uma mulher é o espelho. Que aflição para uma jovenzinha tê-lo esquecido no momento de abastecer seu nécessaire. Seria uma verdadeira tragédia: “Ai, não acredito!!!” Afinal o espelho é o símbolo máximo da vaidade feminina. E não só feminina! Hoje cada vez mais os homens estão preocupados com sua aparência. Mas, convenhamos, não há quase nenhuma mulher que não aproveita para reparar seus cabelos e silhueta ao passar em frente a uma vitrine, grata pela combinação prodigiosa de luz e sombra a formar um oportuno espelho.
No espelho se contempla a própria beleza e se, possível, se pode retocá-la.
Nosso mundo atual, é fascinado pelo brilho, pelo fashion. Uma semana de modas faz parar quase boa parte da humanidade. A imagem hoje custa milhões. A gente tem que brilhar! Melhor ainda se brilhar diante das câmeras de uma rede nacional de televisão. Aliás, o que é uma câmera senão um jogo de espelhos que geram a imagem?!
Voltemos nossa imaginação para 800 anos atrás. Entremos num palácio medieval da longínqua Itália, no palácio Coccorano. Ali mora uma jovem. Cheia de sonhos, desejos, ideais, valores e fantasias. E acreditem, ali também há um objeto do fascínio feminino. Ali há um espelho. Ali uma jovem da nobreza de Assis contempla, admirada, seus lindos olhos azuis, sua face delicada, seu louro cabelo angelical, a cobrir seus ombros e até seu esguio busto de uma encantadora filha da nata social assisiense.
Demora-se apaixonadamente ante aquele espelho...
Mas qual sua paixão? A quem quer oferecer aquela beleza deslumbrante?!
Quais sãos seus sonhos mais ocultos? Quais seus propósitos mais secretos?
“Encontrei o Amor da minha vida, encontrei-o e não o deixarei jamais!”
Pasmem! Aquela linda flor de Assis não vê a si mesma no espelho. Não perde seu tempo a cultivar uma beleza que fenece como a flor do campo. Naquele espelho ela não reflete sua beleza transitória e fugaz.
Naquele espelho ela contempla o Belo, o Pastor belo, que atrai perdidamente a amada do Cântico dos Cânticos. Aos 18 anos de idade, nessa época da vida em que toda a natureza conspira para o encantamento físico-psíquico do amor, Clara Favarone está loucamente encantada pelo Amor dos amores. Apaixona-se por um Espelho, Jesus Cristo, e se lança na noite escura da tosca cidadezinha medieval para entregar-se para sempre ao encanto que a cativou, Àquele cujo brilho empalidece todas as luzes passageiras.
Interessante perceber que um espelho não embeleza, antes, pode mostrar as falhas da beleza num rosto. Já o Cristo, o espiritual espelho de Clara, é o Belo e transluz beleza a quem o encontra, contempla e segue.
Anos depois, do seu recinto nupcial, o pobre e despojado Mosteiro de São Damião, Clara começa a corresponder-se com outra enlouquecida jovem. Lá na distante Praga, uma coetânea sua, descobriu ela também um fascínio divino. Quer se fazer esposa do Rei dos reis, contrariando todas as expectativas de sua real família da Boêmia. Renuncia a trono, riquezas, favores, servas, luxo, para desposar Aquele cujo trono é a cruz e cuja coroa é de espinhos.
A pressão da família é grande. A sedução mundana é avassaladora.
Clara se lembra de seu Espelho. E escreve para sua novel amiga, estimulando-a a não mais voltar atrás, mas antes, correr ao encontro do Amado:
“Caríssima amiga, ponha a mente no espelho da eternidade, coloque a alma no Esplendor da glória, ponha o coração na figura da substância (cf. 3 Ct In 12). Inês, feliz decerto é você - escreve-lhe Clara - que pode participar deste banquete sagrado para unir-se com todas as fibras do coração Àquele cuja beleza todos os batalhões do céu admiram sem cessar (4 Ct In 9), pois Ele é o Esplendor da glória (Hb 1, 3) e o Espelho sem mancha (Sb 7, 26)” (cf. idem, 14).
Clara, jovem plena de encanto pelo seu Esposo, convida esta outra enamorada do mais Belo dos filho dos homens (Sl 44, 3) a se apaixonar também pelo Espelho. Retira do baú escondido do seu ardente coração as lições do espelho para a nova esposa do Rei.
“Espelho, espelho meu, haverá outra mais linda do que eu?” Perguntava a famigerada feiticeira do conto. Não certamente será esta a preocupação de Clara. Seu Espelho lhe é fonte de inspiração para a Beleza e não motivos de reclamações e de tristeza.
Ao olhar para o Espelho, seus olhos não se fixam tanto na sua pobre imagem de criatura, mas no próprio ser do Espelho, a fonte originária de sua imagem. Fixa sua mente na substância divina e desmancha seu coração no Amor tão amável e não amado a testemunhar suas loucuras de amor na pobreza de sua doação total: “Já estais tomada, Inês, pelos abraços daquele que ornou vosso peito com pedras preciosas e colocou em vossas orelhas pérolas inestimáveis” (1 Ct In 10). “Creio firmemente que sabeis que o Reino dos céus, ó princesa, não é prometido e dado pelo Senhor senão aos pobres (Mt 5,3)” (1 Ct In 25).
Em Clara vemos como Aquele cujo olhar seduz, que não o comporta o universo inteiro, invade sua alma de pequenina, e transforma-a por dentro e por fora.
Dizem que os apaixonados se tornam parecidos. Há casais cinqüentenários que ficam tão semelhantes que, se diria irmãos. Em Clara de Assis, a paixão por Jesus Cristo produz uma beleza fulgurante, que mais tarde o Papa Alexandre IV vislumbrará na bula de canonização: “Clara, por seus preclaros méritos, clareia claramente no céu pela claridade da grande glória e na terra pelo esplendor dos milagres sublimes” (Bula de Canonização, 2).
Ó cara irmã Clara, queremos que faças por nós, aquilo que pedes a tua amiga Inês: no deslumbre de tua contemplação beatífica, lembra-te também de nós junto ao Belo Pastor! Traze-nos marcados indelevelmente nas tábuas do teu meigo coração (cf. 4 Ct 34). Que tua intercessão ajude-nos todos a mergulhar no reflexo deste Espelho e a sermos transformados inteiramente em sua imagem, à luz do Eterno Esplendor da Divina Trindade (3 Ct In 13) . Amém.

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